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O assassinato da publicitária Mariana Costa pelo cunhado, em 14 de novembro último, devido a uma paixão não correspondida, é só novo exemplo de como a violência contra a mulher não tem freios mesmo com a vigência há exatos 10 anos da Lei Maria da Penha. O caso Mariana Costa ganhou holofotes porque se trata da sobrinha-neta do ex-presidente José Sarney, assim como mereceu destaque o da empresária e ex-modelo Luíza Brunet, que no início deste ano denunciou o então marido por lesões corporais.

Ciúmes excessivos, oposição à separação e companheiros opressores que exercem posição de poder e supremacia, pela ordem, são as três principais causas da violência doméstica contra a mulher, segundo estudo apresentado no mês passado por alunas e professoras do curso de Psicologia da Universidade Metodista de São Paulo no tradicional Congresso de Ciências Médicas e da Saúde da instituição.

O estudo baseou-se em 14 prontuários relatados nas 2ª e 3ª Delegacias de Polícia da Mulher e Participativas. Em 100% dos casos as vítimas sofreram violência psicológica, exatamente metade passou por violência psicológica seguida de violência física e uma denunciou também violência sexual.

O artigo foi realizado em 2014 como TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) da aluna Aline Oliveira Costa, hoje mestranda na Metodista em Psicologia da Saúde, porém o banco de dados utilizado foi construído em 2006 e 2007, quando se realizaram as entrevistas nas Delegacias da Mulher. Significa que, de lá para cá, nada mudou. Dados mais recentes indicam que o Brasil registrou, nos 10 primeiros meses do ano passado, 63.090 denúncias de violência contra a mulher, ou seja, um relato a cada 7 minutos no País, segundo a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. Quase metade (31.432 ou 49,82%) corresponde a denúncias de violência física.

“Sempre compartilho este trabalho devido a importância do tema. Às vezes dou enfoque diferente na hora de montar o banner de exposição. Mas já apresentei outros painéis deste tema como ‘Violência de Gênero: Como se Constituem as Fases da Violência Contra a Mulher’ e também ‘Violência Doméstica Contra a Mulher: Análise das Variáveis Internas que Motivam o Agressor’”, cita Aline Costa, que apresentou este último no Congresso Metodista de 2016.

Ciúmes e dominação

Como o nome enuncia, o objetivo da pesquisa foi investigar quais variáveis internas movem o agressor, já que que continuam tendo maior incidência sobre as chamadas motivações externas. Estudiosos apontam como variáveis internas os ciúmes, situações de estresse, frustração, personalidade do agressor, histórico familiar, padrão cultural aprendido e reproduzido, dentre outros. São apontadas como variáveis externas que favorecem a violência de gênero o consumo de álcool e drogas, dificuldades financeiras e desemprego. Outros fatores desencadeantes estão nos salários baixos, filhos indesejados, ausência de condições para sobrevivência, problemas psicológicos e psiquiátricos, pessoas que foram abusados quando crianças e fanatismo religioso.

“Acostumamos a considerar como violência somente atos que provocam algum tipo de lesão física. No entanto, a violência também ocorre na forma de destruição de bens e violência psicológica com ofensas, intimidação dos filhos, desqualificação e humilhações, ameaças e uma série de atitudes de agressão e desprezo, além de situação de desrespeito seja na rua, nas escolas, nos consultórios, nos ônibus, nas festas e, sobretudo, em casa” – afirma o estudo, que põe o foco em vítimas da violência no espaço doméstico praticada sobretudo por maridos e companheiros.

Quase todos os 14 casos estudados eram de relacionamentos duradouros: 9 conviviam com os parceiros e 7 estavam casadas. “Os dados apontam para relações de desigualdade, dominação, exploração e opressão do outro e fica clara a visão patriarcal de masculinidade, em que os homens sempre estarão no comando dos relacionamentos”, aponta o artigo.

“Ele cortou meus dedos”

Em um dos depoimentos das mulheres estudadas, cuja idade variava de 19 a 45 anos, Elaine, que sofria agressões físicas e maus tratos devido ao ciúme excessivo do companheiro, disse: “Costumo chegar tarde do trabalho e, da última vez, ele cortou meus dedos e me acompanhou até o hospital, para ter certeza de que eu não iria denunciá-lo”. Outra vítima, Camila, também relatou assim os motivos das agressões do companheiro “Ele é muito ciumento, trabalhávamos junto, mas ele saiu por causa de ciúmes”.

O estudo remonta a um ponto aparentemente irremovível: as situações de violência contra as mulheres resultam da relação de hierarquia, que estabeleceu ao longo da história papéis diferentes socialmente entre os sexos, fruto de uma educação diferenciada por meio da família, da escola, igreja, amigos e meios de comunicação em massa. Para o sexo masculino, são atribuídas qualidades referentes ao domínio e à agressividade. Para as mulheres as qualidades atribuídas foram as do “sexo frágil”, pelo fato de serem mais sensíveis e afetivas, qualidades que se contrapõem ao sexo masculino e por isso não são tão valorizadas na sociedade. As relações estabelecidas entre homens e mulheres, portanto, foram quase sempre de supremacia, deles sobre elas.

As justificativas mais comuns para as agressões podem ser resumidas a quatro: a) ela me desrespeitou como homem; b) ela me provocou; c) o homem tem direito a controlar sua mulher; e d) a mulher aceita a situação de violência.

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