Violência contra mulheres ainda é realidade formal, concluem alunos de Pós em Psicologia da Saúde
Leis que criminalizam o agressor, medidas que restringem a aproximação e casas de amparo às vítimas, entre outros, ainda não interromperam as agressões contra mulheres brasileiras. É uma realidade explícita que não escolhe local nem classe social, embora ações pontuais ajudem a conscientizar sobre o tema e a reduzir parte do impacto individual e coletivo dessa violência.
Pesquisas apresentadas por dois alunos de Pós-graduação em Psicologia da Saúde no 1º dia do Congresso Metodista 2023 mostram, de um lado, como a religião instrumentaliza a submissão da mulher e, de outro, como espaços abertos à escuta encorajam as vítimas a enfrentar a rotina de agressões.
Glaucya Stela Tavares estudou a experiência das Oficinas de Diálogo feitas na comunidade Vila Clara, na Capital, e concluiu como é importante criar medidas de escuta ativa. Pelo menos 40 mulheres foram acompanhadas durante dois meses e a totalidade mudou de postura após os encontros. Sentimentos pré-oficinas como medo, dor, sofrimento e fracasso diante das agressões deram lugar a relatos de esperança, busca da felicidade, volta aos estudos e vontade de trabalhar, após as oficinas.
“Quando chegaram, nenhuma admitiu que sofria violência doméstica. Após falarem de suas dores de forma individual e depois em grupos, a postura mudou. A conclusão é que a comunicação interpessoal fortalece as mulheres a tentar romper com o círculo de agressões”, mostrou Glaucya, que, além da escuta ativa, também inclui no processo de quebra desse cenário a importância da mídia na divulgação e conscientização sobre o tema, além da importância das narrativas internas. Ela pesquisou o período pós-pandemia 2022-23 em jornais, sites, TV e rádios e constatou que houve nada menos que 18,6 milhões de mulheres vítimas de algum tipo de agressão no Brasil.
Veja aqui a programação do Congresso Científico da Metodista 2023.
Machismo
Além do machismo convencional muitas vezes movido por ciúmes e drogas, a violência contra mulheres também tem origem na formação religiosa. Textos bíblicos que enfatizam o domínio patriarcal são reproduzidos em pleno século 21 para impingir à mulher a 3S: sofrimento, submissão e silêncio.
“Muitas vezes a igreja endossa o comportamento do agressor e reforça o modelo patriarcal dos textos bíblicos. A mulher fica sem espaço de escuta junto ao seu pastor, acaba se submetendo ao homem e se sentindo culpada pelo mal casamento, além de desconhecer ou não usar as leis a seu favor”, afirma o aluno David Aguiar de Oliveira, cuja pesquisa de Pós em Psicologia da Saúde envolve estudos feitos com evangélicas em Nova Iguaçu (RJ) e Manaus (AM).
Ele também levantou o feminicídio em uma grande metrópole (Campinas) para concluir que violência doméstica ocorre em todos os grupos socioeconômicos. No primeiro trimestre deste ano, 32 mulheres foram assassinadas naquela região, pondo fim a um processo anterior já dominado por abuso psicológico, agressões físicas e humilhações verbais, relatou o doutorando.
“Antes a violência contra a mulher era limitada ao casal. Agora vemos que se trata de uma ferida coletiva. Por isso a universidade precisa produzir conhecimentos científicos que sirvam de base para adoção de políticas públicas”, afirmou a professora Rosa Maria Frugoli da Silva, que coordenou o painel.
Texto: Malu Marcoccia
Última atualização: 24/10/2023